segunda-feira, 18 de janeiro de 2021

Me desculpa Confúcio

 Hoje enquanto vagava pela internet deparei-me com uma frase atribuída ao pensador Confúcio que dizia:

“Para quê preocuparmo-nos com a morte? A vida tem tantos problemas que temos de resolver primeiro”.

E lá estava eu após ler isso pensando na morte. Mais precisamente no momento que antecede a morte.

É comum depararmo-nos com a arte mostrando reflexões na antecedência do fim. Mas, será que é mesmo dessa forma? Será que temos tempo para arrependimentos, ver a vida passar ou simplesmente a morte vem e sequer percebemos enquanto estamos agarrados ao sobreviver?

Pensar nisso tudo me levou de volta à adolescência, um período onde eu não era um jovem exemplar, pelo contrário, acumulava inimigos em brigas de gangues pelo P Sul. Certo dia, em um início de noite, um desses inimigos me encontrou. Aliás nos encontrou, estávamos em grupo e prontos para mostrar o que um bando é capaz. Recordo-me desse dia , pois foi o meu momento de proximidade com a morte e, é interessante como quando relembro a cena passa em câmera lenta em minha mente. Ele sacando a arma, a gente correndo em uma rua da QNP 10, as mães puxando as crianças para dentro, a gente se escondendo no mato, escutando passos onde não existiam, me arrependendo das decisões que me levaram até ali e por fim o alívio de estar em casa. Mas, tem um sentimento que se destaca ao lembrar de quando eu estava deitado no chão do mato de uma chácara na 8/12, antes do Sol Nascente existir, a solidão. Mesmo com Rasek escondido comigo, eu me senti completamente só. Aliás, depois eu vi no matagal um cachorro de rua andando, era dele os passos que eu ouvia e ele também estava só. Só como Hulk, o cachorro do Seu Severiano que quando criança vi atropelado.

Seu Severiano era um senhor corcunda, alcoólatra, que quando estava sóbrio era gente boa e quando bêbado era importunado pelas crianças e puxava um facão para qualquer um, inclusive para nós que éramos as crianças. Sempre andava acompanhado por muitos cachorros de rua, mais de dez, eram seus fiéis companheiros e ele quase nunca estava sem eles. Quase. Seu Severiano foi morto em um beco da QNP 26, à pedradas, nesse dia estava só.

Após sua morte os cachorros sumiram, durante um bom tempo eu fiquei pensando o que tinham acontecido com eles, talvez achado outro que precisasse da companhia, achado um lar, mas todos diziam que tinham sido levados pela carrocinha e virado sabão. Semanas depois encontrei o Hulk, o mais antigo dos cachorros do falecido Severiano, ele estava morto na beira de uma pista, atropelado, só. No dia que o Seu Severiano estava sem o Hulk ele morreu e o Hulk sem o Severiano encontrou também o fim. Talvez o fim seja isso, a solidão. Espero demorar para descobrir.

Desculpe Confúcio, parece que sua frase teve resultado oposto.

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